domingo, 27 de novembro de 2011

RÉDEAS

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Aquilo que freia, que prende, que controla. Rédeas são boas ou não, dependendo do que são -valores, princípios, manipulações, chantagens emocionais; como são - curtas ou longas, se nos dão espaço para sermos nós mesmos; e quem as detém - as regras sociais, dogmas religiosos, as leis, a educação que recebemos ou o que os outros pensam de nós.
Rédeas, todos temos. São a personificação de nossos limites. Limites que nos são impostos, construídos. Os que os outros nos convencem que são nossos.
Rédeas podem significar tantas coisas. Freud nos diria umas, Platão outras e nossos avós ainda outras. Mas, uma coisa todos teriam como intersecção, rédeas não são controladas pelo "enredeado", elas empre estarão em outras mãos.
Eis a questão! O subjetivismo do termo rédeas, sendo aplicado à nossa vida cotidiana, significa freio autorizado por nós nas mãos de outro.
Grosseiramente, as rédeas podem ser de três tipos: rédeas do medo, rédeas da covardia e rédeas da sabedoria.
As  rédeas do medo nos impedem de viver, de usufruirmos de nossos sensores, desenvolvermos nosso potencial, são freios que alejam, que vão de encontro à força da vida, atrofiando. Mas só têm poder de atuação em nós mesmos.
As rédeas da covardia se estendem aos outros, àqueles que estão sob a nossa égide. Não vivemos por puro medo e arrebanhamos pessoas para engrossar a fileira dos  medrosos. Transmitidas através da educação que damos aos filhos, do exemplo que damos aos sobrinhos e aos nossos demais. O impedimento do outro pela manipulação. Peca quem manipula , peca quem se acomoda à manipulação. É precedida, normalmente, por antolhos, porque fica mais fácil quando o início é a diminuição da perspectiva, do olhar, do interpretar, do ver.
As rédeas da sabedoria são as rédeas que nos impedem de ultrapassar limites, desfazer famílias, desrespeitar amigos, pisar subalternos, ferir pessoas, matar, adquirir proventos de origem duvidosa, atuar na inveja, na sordidez, viver no ócio, na indolência e toda a sorte de malefícios que, além de castigar o corpo, fere a alma.  Elas nos impedem que nos entreguemos ao prazer sem medida, que não têm fronteiras e prejudiquemos a outros e a nós mesmos.
As nossas rédeas estão nas mãos da nossa formação, da possibilidade de punição cível e/ou criminal; na forma com a qual vemos a vida e do que esperamos dela. As nossas rédeas são o freio do bem. Aquilo que evita que num ato passional percamos o fio da meada do que viemos fazer aqui.
As rédeas são as nossas fronteiras de nós mesmos. A área limítrofe que cerca nossa atuação.
Benditas rédeas!....Malditas rédeas!




domingo, 20 de novembro de 2011

MENDICÂNCIA

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Mendigar é o ato de pedir, pedir seja lá o que for. Normalmente associamos a palavra às esmolas que damos ou vemos serem dadas à quem mendiga, à quem pede.
Mas existem vários tipos de mendicância, de petição. A petição de atenção que começa com a necessidade de atenção do pai, da mãe, da professora e se extende à petição de atenção do namorado(a), do cônjuge, dos filhos. A petição de carinho, que começa com a necessidade de carinho do namorado(a), dos amigos e se estende à petição de atenção desmedida, do conjuge, do(a) amante, do(a) ficante, do(a) colega, do cachorro...
Essas coisas se pedem porque são dispensações alheias, sempre. Aquelas que são de nossa alçada impor para que recebamos, impomos; respeito, bom trato, honradez, admiração e etc..
Mas, essas coisas da alma que são do tamanho do vazio que possuímos, não tem jeito. Então, algumas vezes trocamos, nos deixamos aviltar para receber um pouco de atenção, nos deixamos ser vilipendiados para recebermos um pouco de afago, tanto quanto um cãozinho ao lado de um adolescente com um controle remoto de um jogo eletrônico nas mãos. Quando elas estiverem desocupadas, recebemos as migalhas.
Quantas vezes por não sabermos/querermos enfrentar nossa realidade, carência, carma, cruz, como chamem, vivemos coisas que não queremos, por medo, medo da solidão, medo do futuro, medo da vida, por não termos coragem de enfrentar uma realidade que nós escolhemos.
Nossa alma sabe que o mais precioso não é o que fica, é o que vai conosco. Nós também sabemos, e nem damos nem sabemos receber.
Vivemos a vida num jogo esmolativo, ignorando que se alguém quer a nossa atenção, o nosso carinho é porque somos importante para alguém e vice-versa. E não há nada mais importante do que ser importante para alguém.
E usando de todas as nossas interferências contextuais, jogamos. Triste jogo, pobre jogo. Nunca esqueçamos que o cãozinho que implora o carinho ao lado do adolescente com um controle remoto nas mãos, também vai embora.
Esmolar, mendigar, seja lá o que for, tem limites. Como disse Miguel de Cervantes " Nunca implore por algo que você pode obter".


domingo, 13 de novembro de 2011

A HARPA DE DAVI

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Conta-se na história dos hebreus que havia um rei  guerreiro, autoritário e triste chamado Saul que em seus devaneios de ansiedade precisava da música como bálsamo e refúgio,  e solicitava a um menino que tocava harpa, chamado Davi, que tocasse para ele.
Os acordes da harpa de Davi eram calmante para a alma de Saul. As inquietações, angústias, tristezas, pesares e preocupações que assolavam seu espírito e o deslocavam do eixo eram dissipadas pelo poder da música. O transporte da alma de Saul era uma harpa. O veículo que o lançava às origens, ao berço das almas e lhe dava paz entrava pelos ouvidos, amainava as dores, curava as feridas, cicatrizava os arranhões, dizimava o medo, dava tranquilidade, perpetuava o que ele tinha de puro, dissipava as perturbações e o lançava ao útero do universo lhe dando alento, lhe fornecendo a recarga de baterias que suas responsabilidades exigiam.
Saul era um leão em sua selva, rugia, dominava, tresloucava-se em delírios, pois era um homem de espírito extremamente inquieto e descobriu nos ouvidos o portal de entrada da paz, da serenidade por meio de um instrumento pesado e difícil, mas de som suave e tênue.
A música era o remédio da alma de Saul e tocada pelas mãos pequenas e inocentes de um menino que sequer tinha noção das agruras que podem se aninhar na alma de um homem, do leito de sentimentos que é o espírito cuja existência se estende por toda a eternidade.
Davi era a força motriz que possuia a pureza, a leveza e a não-contaminação. Dos acordes que saiam da harpa de Davi iam com eles também a energia do próprio Davi, um pouco de seu ser se etereizava pela música e esse unguento servia na medida certa a Saul.
A música tem o poder de levar-nos onde quisermos, só o que se tem a fazer é entregar-se. O único momento em que Saul entrava em contato consigo mesmo e sua essência era quando se entregava, se largava, se deixava. Deixemo-nos....permitamo-nos por um momento sermos Sauls. 







domingo, 6 de novembro de 2011

SILENCIAR

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O silêncio é o grito do "entrego os pontos", é o sinal verde do "desisto", é o ponto de exclamação do "era isso!".
Quando nascemos, gritamos, choramos, berramos e se não o fazemos, nos fazem fazê-lo. Um bebê chora pra tudo, grita pra tudo. Uma criança fala o tempo todo, fala muito, fala com todo mundo, até quando não sabe falar.
À medida que crescemos vamos aprendendo a ouvir e para ouvir calamos. O silêncio se instaura nas nossas vidas com o nome de aprendizado e vai se tornando o maior estelionatário etéreo que se pode conhecer. Ganha nomes como: ansiedade, suspense, medo, ultraje, decepção, sabedoria.
Quando buscamos algo, sonhamos e nos movemos para alcançá-lo e não conseguimos, silenciamos.
Quando queremos muito alguma coisa que não depende de nós, enquanto aguardamos, silenciamos. 
Quando esperamos o resultado de uma prova ou de um exame médico, silenciamos.
Quando não sabemos o que tem adiante e nos aflige o que pode vir a ser, silenciamos.
Quando a expectativa emocional não é correspondida, silenciamos.
Quando vemos alguém de uma forma e ela se apresenta de outra, silenciamos.
Quando estamos diante de uma questão para a qual temos a resposta, mas que ela é só nossa e existem outras respostas tão válidas quanto e que cada um tem direito à sua, sabiamente, silenciamos.
O silêncio tem muitas faces mudas. Só quem conhece a cara do silêncio é o seu dono.
E ao longo da vida aquele senhor ausente no início, vai tomando espaço, vai se fazendo presente, vai se tornando uma entidade com vida própria, vai virando amigo de infância, se transformando numa pessoa. A nossa melhor companhia.
O silêncio é alguém que construímos para nos acompanhar, tem nome, endereço, cara e fala sozinho. O silêncio não é ausência de som é presença de espírito. Silenciar é dizer alguma coisa.