sexta-feira, 25 de março de 2011

A MAIÊUTICA DE FRITZ LANG

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      Diz-se, conceitualmente, que maiêutica é o parto de idéias. Superficialmente, poderíamos  exemplificar, com uma cena em que duas pessoas expressam sua opinião sobre uma determinada idéia e, a partir dessas discussões, surge uma terceira idéia, uma terceira vertente não pensada anteriormente. Isso, grosso modo falando, sem pretenções didáticas ou acadêmicas. Esse exercício se dá no cotidiano sem que percebamos.
      A abertura da temporada 2011 no Teatro Municipal do Rio de Janeiro apresentou o filme "Metrópolis", um ícone do cinema de arquitetura, de cunho expressionista e que personifica a miscelânia de idéias e sugestões audio-visuais que resultam em novas idéias paridas - a tal maiêutica.
      Esquartejando o contexto, temos o autor da obra visual Fritz Lang, um austríaco, arquiteto, pintor e escritor que, após lutar na 1ª guerra Mundial, inseriu-se no mercado de cinema alemão, cujo objetivo - das Companias de Cinema Alemãs - além de comercial , era o de fomentar a cultura alemã e melhorar sua imagem internacionalmente, através das artes.
      Surge "Metrópolis" (1927), uma criação futurista, com transportes aéreos, pontes entre os arranha-céus, prédios homéricos e visão tecnológica, bem afeito à veia de arquiteto do autor. Imiscuídos com exageros de expressões facial e corporal, abordando a crítica ao capitalismo, com sua alienação e objetivos vazios, a sustentação de uma elite por uma horda de trabalhadores " não pensantes", passando pelo viés da utopia, onde sentimento e humanização seria o caminho de união entre dominados e dominantes.
      Aliado a isso temos o co-autor, o alemão Gottfried Huppertz, músico e ator, convidado a escrever o acompanhamento musical, para dar vida ao monstro produzido. A trilha sonora fala por sí só, com um tema para cada personagem. O tema de Freder (o filho), que também é o mediador com tema diferente; o tema de seu pai ( Fredersen ); o do cientista ( Rotwang) e o tema da principal personagem (Metrópolis). Não sendo suficiente, Huppertz  cria temas para grupos de personagens, o tema dos trabalhadores enquanto cordeiros e dos tabalhadores enquanto revoltosos e... que genialidade! temas musicais para situações: um Foxtrot para o baile; uma valsa para o jardins dos prazeres; a Marseillaise para a inssurreição e o tema de amor de Freder e Maria.
      Idéias díspares que se unem e formam um todo aprazível aos olhos, ouvidos e alma. Formando um terceiro produto fantástico de degustação cultural. Mas a costura desse terceiro produto, dessa maiêutica concretizada, personificada, é o tempo. 10 segundos de atraso na execução da música ao vivo...muda toda história, altera todos os sentidos, do que se vê ao que se sente. A união do tempo de execução com o tempo de projeção é tudo.
      Neste parto de idéias o exercício humano é o de sincronia, atenção, meticulosidade. Cada organização de idéias, tentativa de crescimento, nos leva mais perto do divino, do surreal e da perfeição. É isso que é a arte, a trilha da perfeição, do registro concreto do que não é palpável. Gênios são pessoas que se libertam para realizar o que visualizam, o que vislumbram. Visionários? Sim. Semi-deuses no realizar de seus intentos e, privilegiados somos nós, que temos a oportunidade de beber dessa fonte e nos aproximarmos deles. Maiêutica é progresso, é criação, é devir.

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